sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Uma dose de morfina

O rapaz olhava apreensivo para sua esposa, deitada na cama, dormindo. Sono natural? Não, era um sono levado pelos remédios, morfina, e todos outros remédios que amenizavam a dor dela.
PI. PI. PI. PI. PI. PI. PI. PI.
A máquina indicava os batimentos cardíacos, agora normais. À noite, com a dor, os batimentos oscilaram o tempo todo. Mas finalmente o som era menos torturante. Ele apertava levemente a mão dela, para caso ela acordasse, ela sentisse que ele estava ali, ao lado dela.
- Engraçado, não é Carol? Desde que nos conhecemos você sempre fez questão de pegar nas minhas mãos primeiro. Desde nossa lua de mel você gosta de acordar de mãos dadas comigo – ele sorriu de leve, falando baixinho, apenas para ele mesmo ouvir – apesar de você não saber o porque.
Ela se mexeu na cama e abriu os olhos. Ela sorriu ao ver o rosto de Marcos. Ele estivera ao lado dela em todos os momentos difíceis, e agora não seria diferente. Quando ela viu seu cachorrinho morrer, foi ele que a ajudou, quando sua mãe ficou doente foi ele que sempre levava-a no hospital, e quando ela recebeu o resultados dos exames era ele que estava do seu lado....
-Querido – ela levou uma das mãos ao rosto dele – como você está bonito – ela disse sorrindo.
- Você continua linda como sempre, Carol.
Apenas um mês antes, a vida dos dois virou às avessas. Casados a pouco mais de um ano, Carol e Marcos estavam aproveitando a vida de recém-casados. As dores de Carol começaram a aparecer aos poucos, até se tornarem insuportáveis. Eles foram ao médico, que fez uma porção de exames, e o resultado foi inconclusivo. Por indicação, Carol foi em outro médico. Este encontrou uma massa em seu rim, que estava se espalhando rapidamente pelos outro órgãos. Carol não teria mais tanto tempo de vida. A menos que os remédios diminuíssem a ação da massa em seu rim.
Carol fez uma careta. Marcos chamou as enfermeiras, mas elas não podiam aumentar a dose de morfina sem a prescrição médica. Carol mudou de posição e a dor melhorou. Ela estendeu a mão e pegou os dedos de Marcos, entrelaçando-os nos seus.
- Ah Marcos, nunca poderei ir com você na Alemanha.... – disse ela, um sorriso triste nos lábios.
- Não amor, nós vamos sim. O doutor disse que os remédios iriam te curar. – Ele disse.
- Não vou poder ir também com você na Europa, e visitar todos os países como planejamos enquanto éramos namorados... – Ela disse, o sorrindo desaparecendo de seus olhos.
- Amor, não diga isso.
- Eu queria tanto realizar meus sonhos ao seu lado. Conhecer Paris, andar e andar pelas ruas da China, navegar pelo Caribe... – nesse momento, ela não mais sorria. Uma lágrima se formava no canto de seu olho.
- Me escute Carol – disse ele, apertando as mãos dela – nós vamos realizar nossos sonhos juntos. Você vai ver. Vamos nós dois juntos viajar por 6 meses. Dirigir sem rumo uma vez na vida, você vai ver.
Carol começou a derramas as lágrimas que estavam lutando para sair de seus olhos.
- Marcos – disse ela aos soluços – eu queria tanto envelhecer ao seu lado, queria ver seus olhos assim que acordar todos os dias de minha vida, queria abraçar você quando tivesse um pesadelo...
Ambos choravam.
-Nós vamos estar juntos sempre, Carol.
Marcos beijou Carol na testa e logo em seguida, nos lábios.
-Eu amo você, meu amor – disse ela, a voz vacilante e rouca.
-Eu te amo, minha Carol – disse ele com um sorriso.

Ela sorriu e fechou os olhos. A máquina parou de apitar com intervalos regulares e agora o único som que se ouvia naquele quarto era apenas um PI contínuo e Marcos chorando.

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